18 de janeiro de 2012

Breve relato a uma pessoa preferida

há tempos devia ter feito isso, mas nunca é tarde pra morrer de culpa mesmo... Poderia ser uma mulher, qualquer uma, como daquelas que conhecemos na noitada e ficamos ansiados a encontrá-la noutro dia. Mas não. Houve uma história, uma história diferente. Ela era desinteressada das coisas e eu desinteressante. Acho que por isso combinamos. Dois anos de convívio virtual. Eu querendo vê-la na Webcam, coisa de moleque perdido, ferrenho e comum. Ela, nem aí, fingia de desentendida das coisas. Coisa de menina, sim, era uma menina. Este era meu encanto. (!) Com ela aprendi a conversar, a ver o mundo de formas diferentes, ela me falava de pintura, das grandezas do mundo, das vivências da cidade grande, da crueldade dos homens. ( sim, aqueles que pensam que mulher que é mulher sabe cozinhar, lavar e ser boa de cama.)Ela era boa de longe já se via seu coração, coração maior que a cara que vivia a tapas. Tapas do mundo? ó dúvida cruel, não sei, ela nunca me dizia as coisas por inteiro. Gostava de meias verdades. O nome dela? não sei, não lembro, nem sei se interessa a alguém. Descobri que ela era mulher depois de algum tempo. Isso se transformou em algo interessante. Quis encontrá-la, tinha telefone e peguei. Guardei seu número na minha carteira. Como garoto tímido que sou, resolvi deixar pra ligá-la num dia apropriado, quando estivesse cheio de novidades e surpresas. Ora pois, guarde isto, um tio, que vivia pelas ruas dizia, 'se fores pra guerra, guarde segredos em tuas mangas.' Tentei. Segui os conselhos do velho. Fiquei esperando a hora de ligá-la e prometia, prometia um dia encontrá-la e levá-la a lugares encantadores, encantadores como suas palavras. Mas sua voz? - A voz não sabia. Um dia, dia desses de se encontrar a família, resolvi fazer algo diferente. Fiz minhas malas e acenei ao meu povo: Adeus, estou indo de viagem. Era natal, melhor dia pra encontrá-la. As ruas vazias, cidade grande, todos moradores da grande Deusa de arranha-céus estavam indo para o interior, interior onde nasciam e se formavam e aprendiam a ser gente. Pra mim, a melhor hora, sem comprar presentes, fui me fazer presente e me aventurar em sonhos. Enfim, a encontrei, ela era simples, dizia que não era boa de histórias e não queria falar muito de si, queria saber de mim. Era realmente um sonho, mas tive bastante tempo para desvendá-la, não o suficiente, mas o bastante para realmente amá-la de verdade. Ela me falava dos laços de Clarice, da vida de Macabéia e Doralice e Ducinéia, Dizia ser suas crias. Me contava de suas trapalhadas (não dela, das meninas) Ducinéia era a mais esperta, não esperava a noite, gostava das tardes para fazer suas traquinagens, saia de casa ia pro bar, bebia arrotava, escrevia em guardanapos caminhos perdidos e ainda sobrava tempo para sacanear o diabo. Um dia, me disse, resolveu seguí-la, a espreita, entrou na casa errada, porque o diabo é errado e Ducinéia se despia para sua cara e tara de gozo. Ela via, via e chorava. Mulher de coragem, voltava pra casa desencantada. Pensamentos mils diferentes, olhos ágeis queriam fugir do mundo, realmente desistir. Quando voltava a ser criança, e Macabéia, sua doce menina vinha e abraçava suas dores, sorria, fazia tranças nos cabelos, pintava as unhas e fantasiava uma mulher de graça. Mulher de graça ela era e sabia e confiava em sua menina. Já Doralice era forte, menina do meio, revoltada e frígida com o mundo. Gostava de se maquear, conhecer pessoas e falar-lhe amores, falar-lhe vida, brincar de palhaça e delicademente contar-lhes verdades. Doralice era uma figura, amava arte e jogar, jogar cartas em garrafas de vidros na beira da praia. Aquela mulher, a mulher que falava, não sabia contar histórias e sonhava agir um livro, mas não falava como. Ela era uma mãe. dedicado a Olga mota. Clayton Pires